Há oito anos, quando o poker brasileiro já começava a ganhar corpo, mas ainda muito longe do tamanho que possui hoje, Felipe Mojave colocava seu nome em destaque em um evento de Pot Limit Omaha no WSOP Circuit na África do Sul. Na ocasião, o profissional faturou quase US$ 37 mil e se tornou o primeiro brasileiro dono de um anel do circuito, que hoje conta com dezenas de brasileiros campeões.
Desde aquela vitória, foram muitos os resultados de Mojave no circuito mundial de torneios, em diversos países. Segundo o HendonMob, ele soma mais de US$ 2,5 milhões em resultados ao vivo na carreira, segundo o segundo brasileiro mais premiado, atrás apenas de Alexandre Gomes. O segundo anel, inclusive, já bateu na trave várias vezes.
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No ano passado, por exemplo, o brasileiro terminou duas vezes com o vice-campeonato no WSOP Circuit Rozvadov, na República Checa. Nesta edição da WSOP Brazil Rio, Mojave também chegou perto, terminando na terceira colocação do evento de Pot Limit Omaha, mesma modalidade que rendeu o primeiro título. O profissional concedeu entrevista ao SuperPoker relembrando o título e exaltando a organização dos eventos no Brasil. Confira.
Você foi o primeiro brasileiro campeão do WSOP Circuit, em uma época na qual quase ninguém daqui jogava esses eventos. O que você lembra daquela conquista?
Eu lembro que, na época, foi um negócio muito bacana, porque era difícil achar um amigo que viajasse o circuito com você. Apesar das dificuldades naquela época de rodar o circuito, com certeza maiores do que hoje, eu estava ali realizando um sonho. Lembro que muita gente comentou na época: “Espero que isso ajude a abrir portas, que a galera comece a jogar mais, que uma dia a gente jogue esses torneios no Brasil”, e olhe onde estamos. Só isso aí é o que já vale dessa conversa, por isso que hoje sou muito grato por tudo que consegui conquistar, muito feliz para onde o poker no Brasil está indo e contente de ter esse pequeno ato durante a minha história que de alguma forma possa ter contribuído para o que está acontecendo hoje. Isso é uma das maiores vitórias da minha carreira, ter conseguido abrir essa porta para mim e para outras pessoas também.
Após cinco anos, um grande evento de poker volta para o Rio de Janeiro, e ainda aqui no Copacabana Palace. O que achou do evento?
A primeira coisa para dizer é que o Rio de Janeiro merece um evento desses. A cidade tem historicamente diversos jogadores dos melhores do Brasil, é um mercado grande, de um povo apaixonado por poker. Posso dizer, por experiência própria, que, por exemplo aqui no evento de Omaha que eu tive a felicidade de jogar até o final, o field é a maioria de cariocas, e eu pude constatar quanto os cariocas realmente são bons no Pot Limit Omaha. Pelo fato de um evento voltar agora para o Rio, a gente não tinha muita essa noção, porque jogamos a maioria das vezes com o field local, jogadores da região, e eu fiquei impressionado, o pessoal aqui está de parabéns pelo nível de poker que apresentou.
É uma porta que está se reabrindo, esse evento foi espetacular na minha opinião, super bem organizado, local muito bom, uma variedade bacana de eventos, acho que só tem a melhorar. Essa reabertura das portas tem como trazer eventos ainda maiores aqui para o Rio de Janeiro, não só pelos cariocas merecerem um evento desse, mas todo mundo quer viajar para o Rio também, uma cidade muito bonita que todos querem conhecer.
Ano passado, na República Checa, e aqui, no evento de Omaha, você já bateu na trave do bicampeonato. Como é lidar com isso?
Foram várias traves, só lá eu fiquei em segundo duas vezes, fiquei em terceiro aqui na WSOP, fora outras mesas finais, mas essa é a vida do jogador de poker de torneios. Se você só ficar satisfeito quando cravar um torneio, vai viver frustrado, triste, e não vai conseguir enxergar as bençãos que tem na sua vida. Fui muito abençoado de conseguir jogar mais um torneio, fazer outra mesa final em um field de qualidade, tenho que ficar contente com isso. Naturalmente queria ganhar o torneio, dei meu máximo, na melhor das minhas habilidades, como se fosse um buy-in exorbitante, porque todo torneio que a gente joga a ideia é colocar o máximo, e esse eu joguei como se fosse o último torneio. Fico um pouco frustrado, é natural ficar, mas no desenvolvimento da minha carreira isso altera zero, então é seguir trabalhando e tentar alcançar mais mesas finais, porque sabemos que jogando dentro dessa probabilidade, com bastante foco, alcançar as mesas finais é uma consequência, e ganhar o torneio é consequência também.
Ainda não temos um brasileiro campeão de anel e de bracelete da WSOP. Ganhar um bracelete é uma obsessão para você ou vê como apenas consequência?
Nunca foi uma obsessão para mim, acho que o pessoal dá um valor absurdamente mais alto do que é, principalmente sabendo como é a vida de um jogador profissional de poker. Temos exemplos de diversos jogadores no mundo que são gigantes do jogo e não têm um bracelete. Isso com certeza não coloca esses jogadores para baixo e também não coloca um jogador que tem para cima. Tirando essa parte técnica, de desenvolvimento, naturalmente é uma vitória, uma joia, que você quer ter no seu currículo. Eu lembro exatamente a primeira oportunidade que tive de ganhar um bracelete, em um evento de Pot Limit Omaha em 2009, de buy-in US$ 5 mil, onde eu era favorito 10 para 1 no flop, mas se você ficar pensando nisso… Isso só reforça a força de vontade e a qualidade que estamos impondo dentro do jogo, a ideia é chegar e repetir a dose, porque a bola que bate na trave uma hora entra.
É um sonho ganhar, claro, mas eu tenho certeza que na minha carreira é algo que vai acontecer mais cedo ou mais tarde, principalmente por jogar todas as modalidades, eu terei mais chances do que outros jogadores, então espero que quando aconteça não venha só um, porque estou trabalhando para isso. Mas tenho outros objetivos na carreira, sou jogador de cash game também, pretendo voltar com meus treinamentos agora, então talvez tenha um volume de jogo diferente, com alguns objetivos pessoais também, mas vou seguir firme na luta por esse bracelete.
Sobre a questão de obsessão, minha obsessão sempre foi maior com os EPTs. Foi onde eu comecei, onde tive meu primeiro cash que foi o primeiro de um brasileiro na história do EPT, sei que também tem o lado de ter ganhado o primeiro anel, mas eu tinha mais vontade de ganhar esse torneio do que a WSOP. Agora como o EPT voltou e a WSOP está ai, vou ter que ganhar os dois (risos).
Você é um dos brasileiros que mais viaja para torneios internacionais. Como vê a WSOP Brazil em comparação com outros eventos?
Ano passado eu fui o jogador no mundo que mais premiou em diferentes países, premiei em 13 dos 14 que joguei, então joguei para cima e para baixo, e a organização aqui não deixa nada a desejar. Nem a organização, nem o staff, ou seja, dealers, floors… Estamos no mesmo nível do que a turma lá, o que torna o brasileiro um trabalhador especial, porque nós somos novos nisso tudo, tanto como jogador quanto como organização, porque eles lá fazem isso há muito mais tempo do que a gente. Então acho que se depender de nós, logo estaremos no topo desse mercado com certeza, mas sabemos que depende de outras coisas, questão política, desenvolvimento do esporte no nosso país. Se tivermos apoio e conseguirmos ser ouvidos, como o trabalho que faz a CBTH, sempre exemplar, acho que quando der esse 100% de regulamentação, de um mercado que para a gente já é regulamentado, mas faltam algumas coisas, acho que a partir daí conseguiremos desenvolver ainda mais.
Ainda existe muita dúvida, principalmente da turma do mercado fora do poker, sobre como funciona a organização de torneios, como é a vida de um profissional desse esporte. É um trabalho que eu deixo de fazer minhas coisas para falar sobre isso, ir na rádio, na TV, falar sobre isso para dar mais informações para as pessoas. O Brasil é um dos expoentes do poker no mundo hoje, seja no poker ou na organização, acredito que é uma felicidade grande para a população em geral, porque a gente tem pouco incentivo. Isso mostra como o brasileiro é inteligente, interessado, eu coloco o poker também como um exemplo para outras entidades se espelharem também sobre quão organizado é o nosso mercado e quão desorganizados são outros que estão aí há muito tempo. Tenho muito orgulho de ser jogador de poker, sentar aqui e não ter nenhum problema, pelo contrário, saber que o staff está no mesmo nível dos jogadores, isso com certeza vai desenvolver nosso mercado mais e mais.
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