É por causa das raízes profundas na cultura e tradição brasileira que o samba, já no final do século XIX e início do século XX, era incorporado como um elemento da nossa identidade nacional. Não rara é a ligação do samba com a antropologia, já que é na Passarela Professor Darcy Ribeiro, conhecida como nosso querido Sambódromo, que acontece um dos maiores espetáculos brasileiros, o Carnaval. Se o gênero de música e dança proliferou no Rio de Janeiro desde aquela época, um século depois, nas águas de Santa Catarina, outro samba nasceu. A coluna dessa semana apresenta as grinders do Samba Poker Team – elas revelam como é a rotina dentro do time, os vínculos com os colegas e instrutores, os desafios da carreira e a superação constante de buscar sempre o high level do game. Hoje, o Samba tem 14 jogadoras ativas. Só neste ano, no PokerStars, elas jogaram aproximadamente 45 mil jogos e faturaram cerca de 65 mil dólares. As que mais forraram foram Salvez Rj (Simone Alves) e Cigana#13 (Bruna Kurtz).
Essas “políticas de transparência” das perdas e ganhos no poker, muitas vezes, migram para a vida da própria jogadora enquanto estatísticas, mas não como estilo de vida. As jogadoras do Samba Team, em sua maioria, são low profile, embora se mostrem superativas nos chats restritos do time fazendo discussões de mãos, reviews de torneios e organização pré-grind. Essa política do sigilo, atribuída às grinders, passa a produzir regimes de subjetivação que nos evidencia como suas identidades são elaboradas a partir de um governo de si e suas tecnologias. A seguir, relato como é o cotidiano deste grupo de mulheres que constrói novas formas de ser e estar no mundo a partir da competitividade do poker e na busca diária de compreender a si mesmas ao maximizarem autonomia de escolhas, empreendimento pessoal, liberdade e autenticidade.
Sambando na cara da sociedade
No Brasil, como em outros países, o feminismo de “Segunda Onda” adotou uma metodologia revolucionária, que foram os grupos de consciência e reflexão. Se para algumas jogadoras com as quais conversei, esse espaço no SuperPoker é uma afirmação da necessidade de dar visibilidade às mulheres, para outras grinders torna-se um espaço de denúncia de várias ordens, que incluem desde os conflitos familiares até machismo e a depressão. Para Bianca Feola (bfeolaXXIII), o cenário ainda é conflituoso “nós temos que nos preocupar constantemente com que roupa podemos ir jogar, com o que vão pensar de nós. Comentários machistas disfarçados de “elogio” nos deixam totalmente desconfortáveis. De qualquer maneira, eu poderia falar horas sobre esse assunto”. Se para bfeolaXXIII a questão do vestuário está ligada diretamente à questão de gênero, Milene Rodrigues (milener) acredita que “para algumas pessoas, o poker é apenas um hobbie e não nos levam a sério, parece que precisamos nos provar a todo tempo”, desabafa ela.
O desfile das campeãs – são elas que compõem a rotina
Há alguns habitus compartilhados entre as jogadoras, que são o warm up do grind e a rotina de exercícios físicos e estudos. De maneira geral, as grinders do Samba jogam na segunda, quarta, sexta-feira e domingo, já que na terça é o dia oficial de aulas no time; geralmente no sábado elas descansam. Mesmo assim, a maratona dos torneios online torna-se cansativa, às vezes, para algumas delas. |_CáKons_| informa “esse ano acabei tendo dificuldade de grindar algumas segundas devido ao cansaço físico e mental acumulados do domingo, que é um dia super puxado.” Muitas delas ainda compartilham a rotina do grind com outras atividades como trabalho e faculdade.
Milene Rodrigues nos conta “fora o grind eu trabalho como dealer duas vezes por semana, terças e sextas à noite, o que dá uma atrapalhada na rotina do grind por conta do relógio biológico”. Sofia Suarez (maryjane786) é estudante e compartilha seus desafios “minha rotina é um pouco puxada devido a estar fazendo faculdade ao mesmo tempo que jogo poker. Nos dias de aula faço um horário de grind um pouco mais curto”. Apesar do cansaço físico e mental que as horas de grind geram, todas elas deixam claro a importância do estudo, da revisão de mãos, das discussões em grupos sobre spots complexos e da troca de informações. Segundo elas, são esses fatores que fazem com que tenham sucesso e busquem o aperfeiçoamento técnico cada vez mais.
Não deixe o samba morrer
Na contínua ressignificação das emoções que é o mundo do poker, o Samba Team representa, para essas mulheres, um fenômeno cultural que modifica a forma como elas se expressam, geralmente no ciberespaço. Ao mesmo tempo, as mediações afetivas em relação ao time mantêm-se inscritas como formas de registros de uma nova sociabilidade na rede online. Sobre a experiência de grinder, Louise Barbosa (LuhhMG) relata que “cada dia que passava era uma emoção diferente, lembro da sensação da primeira FT, da primeira cravada pelo time.” Já para Camila Kons, o aperfeiçoamento da carreira é fundamental: “o Samba, além de contar com nossos excepcionais head coachs, tem uma galera sensacional que é muito empenhada em estudar e evoluir juntos.” A importância de ter aulas, reviews e treinamentos com os melhores profissionais do país também foi apontada por Cristiane Habitzreiter (Crizh), Ana Silva (Anapoker24), Simone Alvez (Salvez RJ), Juliana Polli (Júh x), Bianca Feola (bfeolaXXIII) como crucial na evolução do game. A jogadora Milene Rodrigues (milener) destacou ainda que “as melhores coisas de estar no Samba são o acompanhamento completo que temos, desde os chats de dúvidas, análise de stats e os coachs sempre à disposição para o que for”. A identidade dessas mulheres vinculadas ao Samba Team não é fixa, mas é resultado de formações dentro do próprio time, que reconfigura comportamentos isolados por uma variedade de relacionamentos e interconexões entre elas e os membros do time. São histórias de amor e estímulos de amigos e parentes próximos, que fizeram dessas jogadoras quem elas são hoje. Por fim, desejo que elas não deixem o Samba morrer e nem deixem o Samba acabar, afinal, o Samba foi feito pra elas sambar! Até semana que vem.